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Hervás, graciosa, exibe rico passado judaico

por CLAUDIO SCHAPOCHNIK_Hervás/ESPANHA*

Hervás é uma belíssima cidadezinha de menos de 5 mil habitantes. Cercada por montanhas verdejantes com mais de 100 quilômetros de trilhas para caminhar e andar de bicicletas e a cavalo, o município fica na Comunidade Autônoma da Extremadura, no Oeste da Espanha e perto da fronteira com Portugal, e me conquistou de um modo fácil fácil.

A exorbitante beleza da natureza no entorno, o perímetro urbano pequeno e fácil de percorrê-lo a pé, a gastronomia excelente e a simpatia da população combinada com a rica herança judaica material e imaterial são os motivos pelos quais justifico esse meu encantamento com o lugar. Voltaria numa boa.

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No alto, estrela de Davi em portão de casa no bairro judaico de Hervás e, acima, vista do mesmo (parte baixa da imagem) desde a Igreja de Santa Maria das Águas Vivas, edificada no século 13 na parte mais alta da cidade (fotos Claudio Schapochnik/Que Gostoso!)
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Placa com a estrela de Davi tem alguma relação com a história dos judeus na cidade

Quando caminhei no bairro judaico, que fica na parte baixa da cidade vizinho à margem do rio Ambroz, imaginei uma cena.

Ao andar pelas estreitas vias calçadas de pedra com casinhas geminadas de um a três pisos, residências feitas com emprego de bastante madeira e algumas com balcões, cheguei à rua Rabilero. Lá observei com surpresa uma grande faixa desgastada com palavras e frases em ladino, ou judeu-espanhol – o idioma falado pelos judeus na Espanha: konsalu (com saúde) e kaminos de leche i miel (caminhos de leite e mel).

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Sede da Associação dos Vizinhos do Bairro Judaico…
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…onde está a faixa com frases em ladino

Mais alguns passos e parei em frente à casa onde se crê que funcionou a sinagoga da cidade, onde posei para uma foto, até a expulsão da comunidade judaica de terras espanholas em 1492.

Tomado por um sentimento de emoção e alegria, imaginei por alguns segundos ver pessoas passando por mim, conversando em ladino e andando em direção ao templo para as rezas do início do Shabat – o descanso semanal israelita, que começa ao pôr-do-sol da sexta-feira e acaba ao pôr-do-sol do sábado.

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O editor do QUE GOSTOSO!, Claudio Schapochnik “Schapo”, junto à caso onde funcionou a sinagoga no bairro judaico
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Nome de hospedaria: Beit Shalom, Casa da Paz, em hebraico

Não há mais judeus em Hervás — eles chegaram no século 14 e ficaram, portanto, menos de 200 anos por lá. No entanto, o patrimônio histórico daqueles tempos segue em pé e “vivo”, com apoio crucial da população e prefeitura locais.

Esse bairro judaico foi declarado Patrimônio Nacional em 1969. As placas com a estrela de Davi apontam os nomes das ruas relativas ao período judaico. O legal também é se perder por essa região, que abrigou 45 famílias judaicas antes da expulsão. Entre os sobrenomes, havia os Abenfariz, Calderón, Cohen, Escapa, Hamiz, Mahejar, Orabuena e Salvadiel.

Hervás, graciosa, exibe rico passado judaico Google Maps
Localização de Hervás (em vermelho) na Espanha (Google Maps)
Hervás, graciosa, exibe rico passado judaico Imagem Wikipédia
O brasão de armas da cidade (imagem Wikipédia)
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A Igreja de São João Batista fica onde funcionou o antigo Convento dos Trinitários, fundado por Juan López Hontiveros e María López Burgalés em 1664: casal era converso

Segundo o site da Red de Juderías de España, “um aspecto interessante da Hervás judaica é que depois da expulsão, a metade da então comunidade judaica permaneceu e, inclusive, alguns dos que haviam saído voltaram anos depois”. E aí tiveram de se converter ao cristianismo.

Esses conversos fundaram “a Confraria de San Gervasio e San Protasio, uma instituição que os permitia seguir mantendo em segredo alguns dos seus ritos israelitas” como a produção de vinho kasher, ou seja, dentro das leis que regulam o comer e beber no judaísmo.

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O rio Ambroz e o bairro judaico ao fundo

“No entanto, nas primeiras décadas do século 16, [os conversos, convertidos em português] sofreram processos inquisitoriais bastante duros que inclusive levaram alguns à condenação à morte na fogueira.”

Ainda de acordo com o site da Red de Juderías, “os sefardíes (judeus espanhóis) de Hervás se dedicavam ao comércio têxtil, à arrecadação de impostos para os senhores feudais ou instituições religiosas, ao empréstimo a juros e também à medicina, pois ser médico era uma profissão muito comum entre os judeus da Espanha medieval”.

Em frente ao rio Ambroz e às antigas casas das famílias judaicas, desde 1997, a cidade promove anualmente o Festival Os Conversos. Objetivo: recordar a convivência entre cristãos e judeus e a herança dela até os dias de hoje por meio de diversas atividades – teatro, com elenco amador da própria população; música; gastronomia; mercado; palestras; exposições etc. Neste ano, o evento será nos dias 6, 7, 8 e 9 de julho. Parece ser um evento sensacional.

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Apresentação teatral no Festival Os Conversos (foto do site losconversos.com)
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Os músicos (à esq.) e o elenco da peça junto ao rio Ambroz (foto do site losconversos.com)
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Banca com pães caseiros e barraca com artesanato: no Festival Os Conversos, Hervás volta séculos atrás onde os judeus viviam na cidade (fotos do site losconversos.com)

Fora do âmbito judaico, mas não menos interessante, há o singular jardim do senhor Antonio. O simpático morador, que deve ter entre 65 e 70 anos, é apaixonado pelas centenas de plantas de pequeno porte que cultiva na frente de sua residência. Ele permite a visitação, com entrada franca e mesmo se não estiver por lá, menos no período noturno. A casa fica no caminho do centro até o bairro judaico.

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O senhor Antonio: simpatia e amor pelas plantas
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Placa com instruções

Por tudo isso, e muito mais, me encantei com Hervás. Você entendeu por quê?

SERVIÇO:
Turismo da Espanha
Red de Juderías de España
Turismo de Hervás
Festival Os Conversos

*O QUE GOSTOSO! viajou a convite do Turismo da Espanha e da Red de Juderías de España

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